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segunda-feira, 3 de junho de 2013

Dinheiro apreendido com passageiros de voo tem dono ligado à CPI dos Correios

SÃO PAULO e RIO – A investigação de dois homens no Aeroporto Juscelino Kubtscheck, em Brasília, no último dia 16, com R$ 465 mil escondidos em meias e cuecas, pode levar a um novo escândalo. Segundo a revista “Veja”, o dono do dinheiro, que se apresentou como Eduardo Lemos, empresário, disse que os recursos seriam usados para pagar um apartamento no Rio e nada tinham a ver com cofres públicos, é Carlos Eduardo Carneiro Lemos, um operador de mercado que teve seu nome envolvido na CPI dos Correios, que investigou o mensalão.
A revista lembra que Lemos foi gerente de investimentos da Prece, o fundo de pensão dos funcionários da empresa de saneamento do Rio, e afirma que foi indicado ao cargo pelo PT, por meio de Marcelo Sereno, ex-assessor de José Dirceu. No cargo, ele teria comandado operações que resultaram em prejuízo de mais de R$ 100 milhões ao fundo.
De acordo com as investigações da CPI dos Correios e da CVM, corretoras compravam papéis de baixo valor no mercado e o Cepre os comprava a preços muito acima do que de fato valiam. Em junho do ano passado, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) julgou processos relativos ao esquema, que seria operado com a finalidade de direcionar bons negócios realizados no mercado a clientes específicos e maus negócios a determinados fundos, como a Prece Previdência Complementar. Lemos foi condenado a pagar uma multa de R$ 3,3 milhões.
Numa única decisão da CVM, Lemos foi condenado a pagar multa de R$ 624.147,00 por ter, na qualidade de investidor, ter feito operações irregulares na Bovespa e da BM&F, intermediadas pela Corretora Novinvest, configurando-se práticas não equitativas e operações fraudulentas. De acordo com a CVM, em operações realizadas entre 7 de outubro de 2002 e 9 de janeiro de 2003, Lemos autorizou a compra de papéis com valor acima do mercado também da corretora Bônus-Banval, apontada como uma das empresas que operavam dinheiro do mensalação, comprando e vendendo no mesmo dia um único papel. O esquema era sempre o mesmo: a corretora comprava papel e preço baixo e fundos de pensão recompravam pagando valor alto. O ganho com a operação ficava com a corretor. A Bonus Banval era ligada ao então deputado José Janene (PR), líder do PP, um dos réus do mensalão, que morreu em setembro de 2010.
A “Veja” afirma que Lemos também teria “tramado” operações prejudiciais para os fundos de pensão Refer, dos funcionários da Rede Ferroviária Federal, e da Nucleos, da Eletronuclear. A revista diz ainda que Lemos continua operando no mercado por meio de uma empresa de consultoria financeira chamada Fides Advisor, com sede em Manaus, em sociedade com um amigo. A empresa funcionaria numa sala de escritórios virtuais na capital do Amazonas e Lemos, acrescenta a revista, comanda negócios em Brasília.
Perdas da Prece totalizaram R$ 35,4 milhões entre 2001 e 2005
A lista dos investigados pela CVM no Processo Administrativo Sancionador (PAS) RJ 13/05, julgado em 25 de junho de 2012, incluiu nomes que frequentaram o banco dos réus do mensalão, além da corretora Bônus-Banval Participações Ltda, Breno Fischberg, Enivaldo Quadrado e o empresário Fernando Antônio Cavendish Soares. Todos foram absolvidos pelo colegiado da CVM.
Sócio em três empresas – Tecinvest, Produto Comércio de Mercadorias Ltda e Six Flags Gestão e Participação, Lemos ficou entre os 11 profissionais de investimentos sobre as quais o xerife do mercado decidiu aplicar sanções.
A multa aplicada a Lemos, de R$ 3.362.360,50, foi equivalente, segundo a decisão, a 50% “do valor das operações irregulares intermediárias pela Novinvest CVM Ltda. e outras, durante o período em que era gerente de investimentos da Prece”. Os outros condenados – Marcos César de Cássio Lima, Cristiano Costa Beber, Murilo de Almeida Rego, Rogéria Costa Beber, Christian de Almeida Rego, Gayel Rozane Guilherme Mendes Lemos, Ricardo Siqueira Rodrigues, Bruno Grain de Oliveira Rodrigues, David Jesus Gil Fernandes, Ricardo Chagas Cruz – tiveram de pagar o equivalente a duas ou até três vezes os valores envolvidos nas suas operações consideradas irregulares.
Segundo a CVM, Carlos Eduardo Carneiro Lemos infringiu um dos dispositivos da Instrução n° 8/79 – norma editada ainda na ditadura militar, durante o governo do general João Figueiredo. É uma regra curta, e, em alguns pontos, vaga, segundo especialistas. O item de que o empresário foi acusado diz respeito ao uso de “prática não equitativa”, ou seja, colocar uma das partes de uma negociação do mercado de valores mobiliários em uma “indevida posição de desequilíbrio ou desigualdade em face dos demais participantes da operação”.
A investigação da CVM é uma das muitas ramificações dos trabalhos da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Correios. O relatório final da CPMI aponta que, dos fundos de pensão investigados, a Prece apresentou o “maior volume de perdas em operações com títulos públicos, totalizando R$ 35,4 milhões em valores nominais” entre 2001 e 2005.
A análise do desempenho da Prece mostra que os prejuízos saltaram de R$ 179,8 mil em 2001 para R$ R$ 2,7 milhões em 2002. Nos dois anos seguintes, 2003 e 2004, o volume cresceu assustadoramente, para R$ 15 milhões e R$ 17 milhões. “Em negociações de um mesmo título público, verificou-se que os preços unitários praticados com fundos de pensão apresentaram exorbitante variação quando comparados com os preços negociados pelos demais agentes de mercado”, afirma o relatório.
A CPMI apontou que as perdas começaram “em 9 de agosto, imediatamente após a nomeação do Sr. Renato Guerra Marques à residência da Prece, indicando que os R$ 2,7 milhões foram desviados do fundo de pensão na gestão dos Srs. Renato Marques e do Sr. Carlos Eduardo Carneiro Lemos”.
A gestão da Cedae foi trocada em agosto de 2002, meses depois de o então governador, Anthony Garotinho, ter se desincompatibilizado para disputar a presidência, sendo substituída por sua vice, Benedita da Silva. A sub-relatoria dos Fundos de Pensão, presidida pelo deputado Antônio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA) convocou Carlos Eduardo Carneiro Lemos e outros executivos da Prece a serem ouvidos em sessão no dia 9 de fevereiro de 2006.
No depoimento, segundo a ata publicada no Diário do Senado Federal de 18 de julho do mesmo ano, o deputado Carlos William (PMDB-MG) afirmou que, na gestão de Lemos na gerência financeira da Prece, a rentabilidade da carteira de investimentos em ações (também conhecidos como de “renda variável”) do fundo de pensão da estatal caiu 4,47%, enquanto o índice médio da bolsa de valores de São Paulo (Ibovespa) subiu 6,5%, e os investimentos em renda fixa (títulos de valores pré ou pós fixados, com vencimentos futuros de diferentes prazos). Lemos contestou.
— Esses dados estão incorretos.
O deputado brincou:
— Vou ter que demitir toda a assessoria.
Lemos alegou não ser parte de um colegiado e não ter poderes para decidir as negociações sozinho. No entanto, Renato Guerra, outro executivo da Prece, afirmou que dificilmente o colegiado poderia contestar as recomendações trazidas pelo gerente financeiro, cujo conhecimento do mercado de valores era superior ao dos integrantes do conselho. O deputado ACM Neto questionou a relação de Lemos com Marcelo Sereno e outros políticos, mas ele negou ter relações com qualquer político a não ser o então vereador Fernando Gusmão, a quem disse ter doado R$ 15 mil nas eleições anteriores, de forma regular.
Carlos Eduardo, segundo a CPMI, é primo de Christian de Almeida Rego e de Murillo de Almeida Rego, que tem “sólidas relações de amizade com o Sr. Marcelo Sereno, à época secretário de Governo do Estado do Rio de Janeiro”. Em seu depoimento, outro operador do mercado, Alexandre de Athayde Francisco, afirmou que a indicação do Lemos ao cargo de gerente financeiro, “a exemplo de outras diretorias de fundos de pensão, foi feita pela família Almeida Rego, por meio do Sr. Marcelo Sereno”.

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